Manoel Bione (mbione@papafigo.com)

 

HAVANA – “É no jipe, é no pé, é no jegue/Não há transporte que o padre não pegue…”. A primeira sensação que tive ao desembarcar em Cuba foi a lembrança desses versos de Luiz Gonzaga. Ao longo da estrada que leva a Varadero, onde me hospedei inicialmente, e ao longo de minha curta estadia na ilha, o que via eram paradas de ônibus lotadas.

“De ônibus”, modo de dizer. Ônibus e táxis novos só identifiquei os que transportam os milhares de turistas que desembarcam na ilha. E tome carros velhos – alguns caindo aos pedaços e outros muito bem conservados. Marinetes, Rurais, Jeeps, Ladas… Tudo vira táxis e lotações. Carroças puxadas por cavalos – que eu batizei de “jeguetáxis” -, “bicitáxis” e vai por aí.

E não é barato. Para se ter ideia, uma hora de passeio a bordo de um desses “táxis” custa em torno de dez euros, ou seja, 40 reais. Mas na ilha tudo se pechincha. Passeamos por toda Habana Vieja por mais de duas horas por cinco euros. Isto num bicitáxi, conduzido por um rapaz negro, ex-pugilista, pois o boxe é um dos esportes nacionais da ilha. Ele nos levou a recantos menos “turísticos” de Havana. Fomos, inclusive, a uma casa situada no terceiro andar de um precário cortiço a fim de comprar legítimos charutos Cohibas. Tratava-se da residência de um funcionário da cooperativa da fábrica. Explique-se que as empresas pagam parte dos salários dos funcionários em mercadorias. E eles se viram para vender a fim de completar o parco salário mensal. Notava-se que naquele espaço amontoavam-se de avós a netos da mesma família.

LA HABANA VIEJA – É como é chamada a parte antiga da capital cubana. Lembra o Pelourinho baiano. Só que mais acabada. Existem prédios em restauração, como o Capitólio, mas se você penetra mais, notam-se muitos cortiços em construções antigas e malconservadas. Uma coisa é bem visível, a quantidade de crianças em trajes de escola, com suas lancheiras e mochilas nas costas, a pegar transporte escolar.

Nos papos com nativos dá para perceber o sacrifício que o povo faz para sobreviver. Quase tudo pertence ao governo. Dos táxis novos aos cacarecos. Fiquei impressionado com o fato de que até o bicitáxi fosse estatal. Perguntado sobre a propriedade de um jeguetaxi que alugamos, o motorista, se é que podemos chamar assim, foi claro: “É do governo.” Indaguei sobre quem cuida do cavalo e como é feito o pagamento. Ele me explicou que paga um arrendamento mensal e a manutenção do cavalo fica por sua conta.

Existem em Havana dois grandes mercados de artesanato – que eles chamam de “artesania”. Como o artesanato em todo mundo, tudo é muito parecido. E caro. Bonés a 10 euros, camisetas a 20… Barato mesmo só rum, que não é artesanato, mas se vende nesses galpões. O que me arrependo é de ter comprado apenas seis garrafas de diferentes e excelentes qualidades. E olhe que não comprei Havana Club, pois existe aqui no Brasil e do qual não gosto muito.

Os turistas são numerosos e boa parte deles é composta por russos e provenientes do Leste Europeu. Nesses dias, por exemplo, estava ancorado um navio cruzeiro imenso da Noruega. Vêem-se poucos norte-americanos. Também notamos muitos de língua espanhola, mas não encontrei nenhum brasileiro. Avistei um com a camisa da seleção, de Neymar Jr, mas verifiquei que falava inglês com sua mulher. Ao nos identificarmos como do Brasil, os cubanos abrem um largo sorriso e citam o futebol e o samba, alguns até ameaçam uns passos de nossa dança.

Muitos referem-se a Temer e lamentam o que está acontecendo por aqui, mostrando conhecimentos sobre a América Latina, principalmente sobre a Venezuela e o Brasil.

Nos lugares mais turísticos somos abordados por rapazes que oferecem desde rum a Cohibas “legítimos”. Apenas um me ofereceu uma “chiquita cubana”. Me fiz de desentendido e fui tomar um “mojito cubano”. Acho que fiz muito mais negócio, pois até hoje tento copiar a deliciosa fórmula original e não acerto a mão.

Manoel Bione é médico e jornalista (Visite meu blog: www.papafigo.com)